quarta-feira, 13 de janeiro de 2010

Hidrelétricas causam temor

Moradores de comunidades ribeirinhas que vivem às margens do rio Tapajós, entre as localidades de São Luis do Tapajós e Buburé, no município de Itaituba, estão preocupados com o avanço dos estudos que prevêem a implantação de um complexo hidrelétrico denominado Parque Energético do Tapajós, que faz parte do Projeto de Aceleração do Crescimento (PAC), do Governo Federal.

De acordo com o projeto da Eletronorte e da Eletrobrás, serão construídas cinco unidades de produção hidrelétrica na região, sendo que duas nas comunidades de São Luis do Tapajós e Jatobá e outras três no curso do rio Jamanxim, nas áreas conhecidas como Cachoeira do Caí, Jamanxim e Cachoeira dos Patos.

Os estudos iniciais para a implantação do complexo começaram em outubro do ano passado, com previsão de conclusão até agosto de 2010. Para aprovar os estudos de viabilidade do projeto, em março de 2009 a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) considerou diversos fatores que, na visão dos técnicos, são positivos para a viabilização do complexo, dentre os quais o nível elevado do rio Tapajós em relação ao nível do mar e a possibilidade de produção de energia limpa, com o mínimo possível de impacto ambiental.

Visto com desconfiança por moradores das comunidades que serão atingidas, o complexo hidrelétrico prevê a inundação de uma área indígena e ainda a submersão de comunidades antigas, como Pimental, Buburé, Jatobá, entre outras, todas integrantes do Parque Nacional da Amazônia.

Com o mega projeto, a Eletrobrás pretende implementar um conceito até então inédito no País, denominado usina-plataforma, que prevê operacionalizaçã o semelhante a que existe hoje em plataformas de petróleo. Inicialmente, a expectativa é de que o complexo gere cerca de 10 mil megawatts de energia. O projeto estabelece a abertura de canteiros de obra no meio da mata concentrando as atividades apenas naquele local. Com Isso, a empresa Camargo Corrêa, que atua no complexo em parceria com a Eletronorte, espera reduzir a resistência de ambientalistas e neutralizar os impactos logísticos provocados por um projeto de grande envergadura no meio da selva amazônica.

Diferentemente do que ocorre hoje nos projetos de usinas hidrelétricas, onde se fazem necessárias as construções de estradas e aeroportos, no caso do complexo do Tapajós os acessos serão feitos por meio de balsas ou helicópteros, igualmente como ocorre nas plataformas petrolíferas. De acordo com o projeto, os técnicos vão trabalhar e dormir na plataforma, se revezando em turnos semanais e quinzenais. Outro objetivo é evitar a construção de alojamentos, anulando assim a possibilidade de crescimento populacional nos arredores do complexo. Contudo, por conta dos supostos benefícios ambientais, a Eletrobrás reconhece que o projeto de usinas-plataforma custa bem mais caro que as usinas tradicionais. Para a implementação do Complexo do Tapajós, que deverá gerar 10 mil megawatts, existe a previsão de gastos em torno de R$ 50 bilhões - em Belo Monte, que prevê geração de 11 mil megawatts, serão necessários aproximadamente R$ 16 bilhões, segundo estimativas do governo federal.

A previsão da Eletrobrás é de que a licitação para a construção da primeira usina, das cinco previstas no complexo energético do Tapajós, ocorra em junho de 2010. Os primeiros estudos de viabilidade energética do rio Tapajós começaram em meados da década de 80. Em 2004, a ideia foi retomada novamente pela Eletronorte, em parceria com a empresa Camargo Corrêa.

Inicialmente, com os resultados obtidos, as empresas previam a construção de um complexo de sete usinas. Porém, devido à pressão de órgãos ambientais, reduziu-se a proposta para cinco.

Organizações resistem à implantação

Por conta dos recentes estudos feitos na área e de audiências públicas realizadas em Itaituba e na comunidade de São Luis do Tapajós, várias lideranças da região e representantes de comunidades que serão afetadas pelo complexo já se manifestaram publicamente contra a implementação das usinas-plataforma no baixo Tapajós. Em abril do ano passado vários segmentos assinaram uma carta aberta protestando contra o projeto. No texto, os signatários do documento, identificados como 'Os povos da bacia do Tapajós', refutam a instalação do complexo e afirmam que 'diante do desrespeito das autoridades, nós ribeirinhos, agricultores, pescadores, educadores, jovens, homens e mulheres nos declaramos contrários ao Complexo Hidrelétrico do Tapajós, que além de prejudicar nossa cultura e meio ambiente beneficiará apenas o grande capital e empresas nacionais e estrangeiras' .

A nota afirma ainda que os impactos ambientais, econômicos, sociais e culturais na bacia do rio Tapajós, comprometem a vida humana, animal e vegetal, sem respeitar fronteiras e acordos governamentais. A carta também condena a conivência do governo diante de crimes praticados por grandes empresas construtoras de barragens que 'consomem muita energia, geram pouco emprego, saqueiam nossos recursos naturais, contaminam nossos rios, terra, floresta, ar, destroem e violam os direitos das comunidades locais e comunidades indígenas'.

Uma das lideranças da região, o padre Edilberto Senna, que reside em Santarém, afirma que o projeto destruirá a paz dos povos ribeirinhos e do povo Munduruku, além de provocar graves desequilíbrios ambientais na região do Tapajós, desde a localidade de Jamanxim até a cidade de Santarém. Para o sacerdote, os impactos serão inúmeros no decorrer das obras e depois da conclusão do projeto, uma vez que Itaituba será invadida por uma verdadeira multidão de peões, fator que pode remontar os tempos de garimpo, quando o município registrou índices alarmantes de assassinatos e prostituição.

Corrente contrária à implementação do complexo também é alimentada pelo Conselho Consultivo do Parque Nacional (Parna), que considera o projeto altamente lesivo e impactante. Pelo projeto, a usina que mais afetará o Parque Nacional será a instalada na comunidade de São Luis do Tapajós, edificada em frente ao mirante principal do Parna. Com isso, a formação da represa inundaria 99% do Parque Nacional. Na visão dos conselheiros do Parna, o alagamento traria prejuízos incalculáveis para a biodiversidade que a unidade vem mantendo preservada ao longo de 35 anos.

Texto: Evandro Corrêa, de Itaituba/PA.
Fonte: Amazônia - Edição: Ano IX - Nº 3.547 Belém, 11/01/2010.

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