Fonte: CIMI
Munduruku do Médio Tapajós inicia autodemarcação e juiz dá 15 dias para Funai publicar relatório
Com a previsão do leilão da usina hidrelétrica São Luiz do
Tapajós, no complexo do rio Tapajós, sul do Pará, para 2015 e a
paralisação do procedimento de demarcação do território tradicional, o
povo Munduruku do Médio Tapajós, que abrange os municípios de Itaituba e
Trairão, iniciou no final da semana passada a autodemarcação da Terra
Indígena Sawré Muybu. Cerca de 60 guerreiros Munduruku foram destacados
para a abertura das picadas da autodemarcação. A ação, por sua vez,
ganhou um importante respaldo.
Atendendo de forma parcial a pedido liminar do Ministério Público
Federal (MPF) do Pará, o juiz Rafael Leite Paulo, da Vara Federal de
Itaituba, determinou que a Fundação Nacional do Índio (Funai) se
manifeste acerca da aprovação ou não do Relatório Circunstanciado de
Identificação e Delimitação da Terra Indígena Sawré Muybu no prazo
máximo de 15 dias. Dentro deste mesmo período, caso o relatório seja
aprovado, o resumo de seu teor deve ser publicado no Diário Oficial da
União (DOU).
O relatório, porém, já está aprovado pela Diretoria de Proteção
Territorial (DPT) do órgão indigenista estatal, em conformidade ao
pedido do juiz Federal, faltando então sua publicação. A autodemarcação é
realizada com base nos pontos definidos pelos indígenas como de
ocupação tradicional, e informados aos técnicos da Funai durante os
estudos para a elaboração do Relatório Circunstanciado. No final de
2013, durante reunião dos Munduruku com a então presidente interina da
Funai, Maria Augusta Assirati, em Brasília, ficou definido que o
relatório seria publicado em março deste ano. No entanto, o prazo não
foi cumprido e com a saída de Maria Augusta, em setembro último, a Funai
segue sem presidente.
Conforme as lideranças indígenas, a autodemarcação foi uma
decisão do povo frente à não publicação do relatório de demarcação do
território tradicional. A paralisação do procedimento salienta a
intenção do governo federal de construir o complexo hidrelétrico, que
afetará ainda as terras Munduruku do Alto Tapajós, altura do município
de Jacareacanga. “Sabemos que se demarcar atrapalha a usina. Tem esse
entendimento no governo”, afirmou o cacique Juarez Munduruku. Na região
do Alto, inclusive, já perto da divisa com o Mato Grosso, há quase três
anos os indígenas resistem às investidas do governo para a efetivação
dos procedimentos necessários à construção de outras usinas do complexo –
um total de sete e espalhadas pelo Tapajós com previsão para começar as
operações em 2020.
“Foi uma decisão política diante de uma situação que não deixou
outra saída. Os Munduruku têm afirmado que só saem mortos dali. Dizem
que nenhum projeto que não esteja em sintonia com a natureza será aceito
pelo povo. Esses indígenas são parte daquele meio ambiente. A
autodemarcação é então uma forma de dizer ao governo que eles estão
ali”, informa Haroldo Espírito Santo, do Conselho Indigenista
Missionário (Cimi). Nos últimos meses, os Munduruku definiram que as
conversas com o governo estavam suspensas até a publicação do relatório.
Durante a semana passada, o povo Munduruku então colocou em
prática as estratégias definidas de proteção territorial. A articulação
contou com a participação do Movimento Ipereg Ayu, do próprio povo.
Presentes há pelo menos cerca de mil anos naquelas terras às margens do
rio Tapajós, os Munduruku destacaram grupos de guerreiros oriundos de
todo Tapajós. Reunidos na Terra Indígena Sawré Muybu iniciaram a ação.
“Não vamos parar com a ação. Queremos providências do governo federal
sobre nossas terras", salientou cacique Juarez.
Neste território, afirmam os indígenas, estão presentes
garimpeiros, madeireiros, tiradores de palmito, fazendas de gado e
grileiros. A grilagem de terras, conforme foi constatado nestes
primeiros dias de autodemarcação, aumentou de forma significativa.
Acreditam as lideranças indígenas que o fenômeno seja decorrente da
busca por indenizações governamentais diante das desocupações a serem
geradas pela construção das usinas previstas pelo projeto do complexo
hidrelétrico. A entrada de grileiros acontece, sobretudo, pelo município
de Trairão.
Nas aldeias da Sawré Muybu o cotidiano segue sem exaltações. Por
ordem do cacique, os três horários das escolas indígenas são cumpridos,
as equipes de saúde seguem em suas visitas e atendimentos, os caçadores e
pescadores vão à mata e aos rios e nas casas de farinha a produção não
foi interrompida. Não há notícias de conflitos com prováveis invasores
da terra indígena.
Nenhum comentário:
Postar um comentário